sexta-feira, novembro 10, 2006

Genética

Reconstituição de neandertal
10/11/2006
Cérebro humano herdou gene neandertal, diz estudo
MARCELO LEITEColunista da Folha de S.Paulo

Bruce Lahn continua subversivo. O geneticista da Universidade de Chicago, que deixou a China por razões políticas em 1989, subverte agora a noção de que os seres humanos modernos, Homo sapiens, se distanciam de hominídeos arcaicos pelo desenvolvimento cerebral. Ao menos no caso de um gene, isso pode ser exatamente o que os aproxima, relíquia de um provável episódio de miscigenação com neandertais.O trabalho foi publicado on-line nesta semana pelo periódico "PNAS" (www.pnas.org).
lSeu foco recai sobre o gene microcephalin (ou MCPH1). Em 2005, ele havia indicado uma origem muito recente, 37 mil anos, para a variante mais comum dessa seqüência de DNA (apelidada de "haplogrupo D"). Quando ocorrem mutações sérias no MCPH1, o cérebro cresce só até alcançar um quarto de seu tamanho normal.Esse tipo de gene faz sucesso em qualquer população, pois a maioria dos indivíduos com versões deficientes dele acaba morrendo antes de se reproduzir. Como mutações neles raramente compensam, a maioria das pessoas tem seqüências muito similares. O haplogrupo D está presente em cerca de 70% dos humanos, hoje.Nos outros 30% está presente o haplogrupo que Lahn chama de "não-D", muito diferente do primeiro. A análise estatística de sua estrutura indica uma origem bem mais antiga: 1,1 milhão de anos. Como a espécie humana tem cerca de 200 mil anos, uma versão do gene é muito mais recente e outra, muito mais antiga do que ela. Isso sugere que duas populações ficaram sem cruzar por mais de 1 milhão de anos.Neandertais conviveram com humanos modernos até uns 35 mil anos atrás --data próxima do haplogrupo D. Lahn convenceu-se de que a estirpe atual recebeu pronta dos primos neandertais a versão vantajosa do gene MCPH1. "Nós não fomos capazes de chegar a outros modelos que pudessem explicar de modo razoável nossos dados", afirma.As coisas teriam corrido assim: a linhagem que deu origem ao H. sapiens manteve por centenas de milhares de anos a variante não-D, enquanto D surgia no H. neanderthalensis; após a migração do H. sapiens da África para Europa e Ásia e seu encontro com H. neanderthalensis, um raro acasalamento teria introduzido D no genoma de homens modernos, onde fez enorme sucesso.Para Sergio Danilo Pena, geneticista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o trabalho é "demasiadamente especulativo". "Como [Lahn] não pode explicar a discrepância das coalescentes [variantes], ele usa isso para argumentar que ocorreu a introgressão de um gene neandertal em humanos", afirma Pena, que alerta não ter analisado em detalhe o trabalho.Lahn ressalva que outro ancestral hominídeo pode também ter sido pai e mãe do gene humano MCPH1 encorpado: "Embora favoreçamos neandertais como a fonte potencial do alelo [variante] D, deixamos aberta a possibilidade de outra população Homo arcaica menos conhecida."Svante Pääbo, renomado pesquisador da área na Alemanha, disse à newsletter "ScienceNow" que Lahn apresentou a evidência mais convincente até agora dessa mistura. E avisou que vai procurar a variante D no DNA que já obteve de neandertais. Lahn torce por isso à maneira oriental: "Tenho mais do que uma esperança tênue de que o alelo D apareça no DNA neandertal, mas meu sentimento sobre essa perspectiva está longe da certeza".

Fonte: folha online

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