quinta-feira, abril 20, 2006

Trechos do artigo Reinaldo Azevedo no primeira leitura

“Rouba, mas distribui renda”

Luiz Inácio Lula da Silva disse, na quarta-feira, que o sistema de saúde no Brasil está muito perto da perfeição. Lendo o conjunto de sua fala, entende-se que ele é o responsável direto por tal suposta (e, obviamente, mentirosa) excelência. E por quê? Porque ele teria olhado com mais sensibilidade para a área do que outros presidentes, o que também é mentira. E só o teria feito porque vítima da perversidade anterior do sistema. Sei lá como, ele perdeu um dos dedos mínimos no trabalho. Segundo disse, não fosse ele um “peão”, talvez lhe tivessem deixado ao menos um pedacinho do dedo “para coçar o ouvido” (argh...). Mas, como ele não era rico, então resolveram arrancar tudo de uma vez.

Desnecessário demonstrar aqui que o Ministério da Saúde, sob o governo Lula, é particularmente inepto em meio à inépcia geral. A lambança que havia tomado conta da Funasa até outro dia é o melhor exemplo. E o que funciona na área é herança do governo anterior, da gestão José Serra. Mas esse é o petismo: perdendo ou ganhando, ele declara sempre vitória. Vejam aí: há até quem se orgulhe de ter sido Lula o homem que nomeou o procurador-geral da República, o mesmo que acusa o PT de ter formado uma gangue, uma quadrilha, para assaltar o Estado de forma criminosa. Ou seja: os méritos de o homem denunciar o PT pertenceriam, assim, ao próprio partido.

Não deixa de ser isso uma forma de competência política — pautada, evidentemente, pela pilantragem e pela vigarice. Mas competência ainda assim. (...)

(...) Enquanto Lula faz proselitismo asqueroso com o seu ambicionado cotó de mindinho metido na otorréia, deixando claro qual linguagem ele acha que o “povo” entende e merece, as oposições se mostram incapazes de faturar minimamente as notícias que eventualmente lhe são eleitoralmente positivas. Cito três exemplos, um banalíssimo; dois outros mais sérios.

(...) É claro que o modo de a atual oposição fazer política não vai — nem deve — mimetizar o petista. Cada um na sua. O PT, está claro, não vê problema em dar um by pass nas instituições com o seu povo mobilizado. A força da oposição deveriam ser as instituições. Mas ela parece, no momento, lenta, atrapalhada, incapaz de fazer política. Com a notável exceção de César Maia. Este sempre soube identificar o tamanho do PT e o risco que ele representa.

As oposições parecem contar também, às vezes, com uma futura adesão da mídia, que não virá. Dois ou três veículos fizeram a opção clara pela institucionalidade e perceberam o núcleo autoritário em torno do qual se organiza o PT e sua escatologia totalitária. Mas a média da mídia ainda continua servil, subserviente, negando-se a ver o que há de particular, de específico, no petismo. Ao contrário até.

Muitos enchem a boca para dizer — e escrever —, do alto de sua prepotência burra, desinformada, que todos são “farinha do mesmo saco”. Para estes, o antigo “rouba, mas faz” pode ser tranqüilamente substituído pelo “rouba, mas distribui renda” — como se, de resto, o que se vê aí fosse mesmo “distribuição de renda”. No grau extremo da ignorância, sugere-se que Lula, um dia, foi um puro, quando ainda não fazia digressões nojentas sobre enfiar o cotó do mindinho na otorréia.

A degeneração institucional é de tal sorte, que parece impossível que as coisas sigam no atual estágio. Começando a campanha de TV, talvez possa haver uma progressiva e maciça migração de votos de Lula para Geraldo Alckmin. Mas raramente se fez aposta não arriscada como essa. A inversão eleitoral drástica aconteceu, depois da redemocratização, uma única vez, justamente de FHC sobre Lula, em 1994. Ocorre que o tucano era, então, o candidato do Plano Real, e os brasileiros experimentavam, enfim, o que significava viver com uma inflação baixa e com uma moeda estável. O petismo era o desconhecido — ou o conhecido: Lula era do contra.

Lula e o PT tomaram esse ativo de tucanos e pefelistas e usaram a estabilidade que tanto combateram quando na oposição para pôr em prática outro plano de assalto ao Estado, justamente aquele denunciado pelo procurador-geral da República. Denunciada a prática e quando tudo parecia perdido para Lula e os petistas, Márcio Thomaz Bastos, o mesmo que depôs nesta quinta, jogou uma casca de banana no caminho das oposições. Chamou todos os crimes de caixa dois de campanha e fez um desafio: “Cuspa aqui quem não fez”. E as oposições não cuspiram, resolvendo proteger os seus próprios implicados no crime menor, com o que protegeram os responsáveis pelo crime maior.
E, como não cuspiram, agora engolem sapo.

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