sexta-feira, junho 08, 2012

Dupla ameaça à hegemonia petista? Não... 07/06/2012

O bom estado da economia e o carisma de Lula permitiram ao PT fazer barba e bigode do Brasil nos últimos anos. Mas ambos, a economia e Lula, estão mais fracos. Se fosse viva, a oposição poderia tirar partido disso.

O carisma de Lula, esse herói macunaímico, foi fundamental para tornar o Brasil mais inclusivo e para os pobres se sentirem finalmente representados no coração do poder. Lula lá em si já mostrou um país (mais) inclusivo.
Mas ele não está mais lá. E, mais do que o carisma de Lula, foi a ascensão econômica das massas, fruto da adesão petista ao capitalismo, que abriu esse céu de brigadeiro para o projeto PT de dominação nacional.
Mas com a crise global, que de marolinha não tem nada, a economia brasileira perde lustro e velocidade. O consumo das famílias, mola do neocapitalismo petista, dá sinais de exaustão pelo endividamento crescente. Se avançarmos muito nesse endividamento, podemos criar nosso próprio subprime e nossos próprios bancos estressados.
Há coragem e iniciativa na luta de Dilma e equipe contra o alto juro no Brasil. A crise global é uma oportunidade para esse enfrentamento. A arrecadação de tributos voraz também facilita o mínimo equilíbrio fiscal.
Mas o espírito animal dos empresários murchou com a crise e a percepção de que deficiências graves como baixa educação da mão de obra, infraestrutura precária e cara, ambiente de negócios ruim e pesada carga tributária não são enfrentadas de forma convincente pelo país.
Por isso o desenvolvimentismo, segundo previsões do odiado mercado, deve fechar seu segundo ano com expansão econômica abaixo de 3%, menos que a média dos emergentes e dos latino-americanos. Se ficar assim até 2014, a reeleição de Dilma (ou de Lula) pode perder apoio popular e a oposição, ganhar discurso na área econômica que lhe faltou em 2010.
Mas, sem tragédias gregas ou europeias, as economias global e brasileira devem voltar a crescer mais em 2013 e 2014, com as nuvens de 2012 se dissipando na economia.
Já do lado político, a liderança de Lula sofre pela primeira vez contestação mais séria. Suas preferências eleitorais neste ano geram insatisfeitos como Marta Suplicy e outros. O julgamento do mensalão pode manchar, agora oficialmente, o legado lulista. Mais forte do que isso, a inescapável dicotomia Lula versus Dilma, por mais que neguem, é mutuamente desgastante.
Lula tem como prioridades o mensalão e o seu sonho de aniquilar o que restou da oposição (depois de ter "exterminado" a direita, como prometera). As prioridades de Dilma são obviamente outras. Essa oposição entre criador e criatura enfraquece o PT.
Se a oposição fosse mais forte e organizada, as eleições deste ano poderiam ser o primeiro teste mais forte da hegemonia petista. Mas, como sempre nos últimos anos, quem está na ofensiva é o PT. O grande jogo de poder hoje não é disputado por governo e oposição, mas por Dilma e Lula.
Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos "Dinheiro" (2004-2010) e "Mundo" (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha.com às quintas.
Fonte: folha online

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